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Alexandre de Freitas, artista gráfico, ecologista e fotógrafo. Cozinheiro e jardineiro às vezes. Este blog é um depósito de informações e materiais sobre arte e ecologia. O título do blog é inspirado em um lindo livro da filósofa Elizabet Sathouris - "Gaia, do Caos ao Cosmo".

21/10/2008

Como e por quê ter um jardim mais produtivo

A prática da jardinagem confunde-se com a história da agricultura. É difícil imaginar que as populações antigas estivessem muito preocupadas com aspectos estéticos em uma época em que a agricultura e conseqüentemente a produção de alimentos eram incertas. Mas se avaliarmos o que as plantas realmente significam para as diferentes culturas vamos nos surpreender com a complexidade desta relação entre a espécie humana e as suas plantas cultivadas. A cientista indiana Vandana Shiva observa:"...Na agricultura indiana as mulheres utilizam 150 espécies de plantas tanto para alimentar-se quanto para a forragem dos animais e assistência médica. Em Bengala Ocidental , 124 ervas silvestres colhidas nos campos de arroz têm uma grande importância para os agricultores...(The Ecologist, vol.28, n5). Sendo assim podemos concluir que a jardinagem é antes de mais nada a prática de colecionar plantas úteis e pode ter múltiplas funções no cotidiano das pessoas.

A cultura consumista que moveu a economia do século XX, transformou a prática da jardinagem em uma atividade descartável e com função meramente estética. Atualmente a jardinagem que deveria ser uma ação de proteção da natureza acaba se tornando mais uma entre as muitas fontes de resíduos sólidos e desperdício de água e energia. A destituição da "utilidade" dos jardins é uma herança dos franceses que criaram grandes e artificiais jardins, destinados apenas para o lazer e o deleite estético. Em contrapartida quando voltamos aos jardins mais tradicionais do velho mundo vamos encontrar o que os ingleses denominam de "cottage garden" (jardim camponês) onde predominam entre as diversas espécies de flores do campo, as ervas aromáticas e medicinais entremeadas com frutas e legumes.

Atualmente a cultura ecologista resgata a real função da jardinagem e devolve às pessoas o prazer de cultivar flores, ervas, legumes e frutas em um mesmo espaço. Um jardim pode ser muito mais que um ambiente destinado a enfeitar nossos lares. Nosso jardim pode ser um local para resgatarmos o ofício mais ancestral de nossa espécie, a produção de alimentos. Veja agora alguns aspectos importantes a serem considerados na hora de convertermos nosso jardim em um espaço mais produtivo. Sem esquecer das flores, é claro!

Elemento e função:

Considera-se elemento de um jardim cada componete do mesmo. Ávores, canteiros, lagos, pérgolas, calçadas, etc...Cada elemento deve ter uma função que justifique a sua presença no jardim. Nem que seja apenas para bonito, mas o elemento não deve estar em um jardim sem um propósito. Preferencialmente um elemento tem que servir de suporte para outro. Desta forma são geradas novas e interessantes interações que tornam nosso jardim mais próximo da realidade natural. Na prática isto quer dizer que uma parreira de uvas pode, além de produzir uvas, servir de sombra para o descanso e até abrigar sementeiras. Ou, mesmo uma cerca, que além de determinar limites, pode ser o suporte para um pé de chuchu, este mesmo chuchuzeiro pode agir como um quebra-vento, ...

Diversidade de elementos:

Uma grande variedade de elementos em um jardim torna o ambiente mais equilibrado, proporciona um número maior de interações, e efetivamente oferece uma gama maior de produtos gerados no mesmo. Outra grande vantagem proporcionada pela diversidade de elementos é a possibilidade de ocupar diferentes ambientes já que estamos lidando com diferentes espécies vegetais e animais. Com este procedimento podemos ocupar áreas muito sombreadas com estruturas que não necessitam de luz solar, como composteiras, depósitos de ferramentas, reservando as áreas com sol pleno para as hortaliças, frutíferas e ervas aromáticas. Em áreas extremamente sombreadas podemos cultivar cogumelos comestíveis (é meio complicado mas, é possível) e em locais tão ensolarados e quentes, insuportáveis para as plantas, podemos instalar secadores de ervas e frutas.

Alelopatia:

A presença de determinadas plantas pode estimular o crescimento de outras através das interações químicas ocorridas entre elas. Por outro lado o contrário pode acontecer, e neste caso a presença de determinadas plantas pode impedir ou atrasar o crescimento de outras. Quando programamos uma horta ou um jardim devemos levar isto em conta e tirar o máximo proveito destas interações químicas ocorridas entre as plantas. Em bons manuais de hortricultura é possível encontrar tabelas de compatibilidade.

Introduzindo pequenos animais:

Integrar pequenos animais nos jardins pode ser uma boa alternativa para diversificar nosso espaço e propiciar novas interações. Dentro da idéia inicial de que cada elemento pode e deve ter uma função, vemos os pequenos animais como preciosas fontes de adubo para as plantas e, em determinados casos pode servir como fonte de proteína. Algumas poucas galinhas podem abastecer uma família com ovos durante uma grande parte do ano. Caso o espaço seja realmente pequeno podemos optar por codornas ou galinhas garnizé, que fazem tudo que uma galinha comum faz porém, em menor tamanho. Em uma gaiola de meio metro quadrado podemos criar três ou quatro codornas com muito conforto. Se esta gaiola estiver posicionada sobre uma composteira, a reciclagem é direta. Em pequenos quintais bem ventilados ainda é possível criar alguns poucos coelhos.

Um pequeno lago no jardim cria condições mais favoráveis para diversos cultivos, melhora o aspecto da paisagem, possibilita o cultivo de determinadas plantas que crescem em ambientes encharcados e, dependendo do tamanho do tanque, é possível criar alguns peixes comestíveis.

Gramados e calçadas:

Os gramados nada mais são do que monótonas monoculturas. Ao invés de servirem como cobertura de eventuais espaços de circulação acabam por ser quase a única vegetação em determinados jardins. As calçadas são ainda piores pois além de causarem um empobrecimento na diversidade ainda provocam um impacto microclimático, além de selarem o solo criando, desta forma, um espaço estéril no jardim. Devemos usar estes elementos com muita economia sempre levando em conta que estes devem ter uma justificativa prática para estarem em nosso jardim.

Árvores e arbustos:

O uso de árvores e arbustos em um jardim não pode ser feito de forma indiscriminada. Mesmo porque, o posicionamento de diferentes espécies de árvores é estratégico para tirar o melhor proveito das variações climáticas sazonais (estações do ano). Procedendo desta forma pequenas árvores e arbustos podem alterar de forma positiva tanto o aspecto visual de nosso jardim como podem exercer uma função termo-reguladora. Um procedimento muito simples e de excelentes resultados é o uso de árvores mais altas e com folhagem perene ao sul do jardim (isto só vale para as regiões sub-tropicais e temperadas do hemisfério sul). O lado norte do jardim reservamos para as árvores de folhas caducas (aquelas que perdem as folhas no inverno), na prática o que acontece é que o jardim fica protegido do sol intenso do verão pelas copas das árvores, mas no inverno quando o jardim precisa de mais sol as árvores caducas perdem as folhas e deixam passar toda a luz solar tão preciosa no frio. Também algumas frutíferas conseguem se adaptar bem a pequenos espaços. Destacamos aquelas de pequeno porte que produzem frutos comestíveis e que atraem pássaros. Sugerimos algumas espécies: laranjinha japonesa, tangerina, limão cravo, cereja, figo, pêssego, ameixa, framboesa, amoras, araçá, pitanga, ... Estas frutíferas cultivadas no jardim podem produzir frutas de primeira qualidade para geléias e compotas, que podem durar o ano todo.

Não varrer folhas secas:

A varrição das folhas secas no jardim não deve ser feita sem uma boa (mas boa mesmo!) justificativa. De uma forma geral as folhas secas são a principal fonte de nutrientes para o solo em um bosque. Muita da fertilidade do solo se perde por não sabermos manejar corretamente as folhas secas. Uma boa camada de folhas secas protege o solo, evita a perda de umidade, é fundamental para o controle da erosão laminar (erosão mais superficial no solo, quase imperceptível e que dá início a processos erosivos mais agudos). Quando decompostas as folhas secas representam uma importante fonte de nutrientes. E na prática, em dia de chuva um solo descoberto vai, inevitavelmente encher nosso calçado de lama, o que não ocorre se caminharmos sobre uma densa camada de folhas. Saiba muito mais sobre este assunto lendo o texto de José A. Lutzenberger entitulado: "Folha Seca não é Lixo" disponível na página da Fundação Gaia na Internet (www.fgaia.org.br).

Não fazer terraplagem:

Um erro muito freqüente é a terraplanagem total do terreno onde queremos instalar nosso jardim. Existe um mito de que isto facilita o trabalho e otimiza o controle geral das plantas. Pois bem, os acidentes naturais do terreno podem nos proporcionar locais mais altos e secos junto a locais mais baixos e úmidos; pode ainda gerar locais mais frios e outros mais quentes. Em meio a esta diversidade microclimática podemos distribuir uma gama muito ampla de espécies em nichos específicos. Quando instalamos nosso jardim em um local plano podemos simular esta diversidade climática construíndo canteiros em formato de espiral, que se erguem do solo oferecendo diversos níveis de umidade e calor.

Podando com sabedoria:

A poda deveria ser uma técnica de assistência à saúde da planta. Porém, o que vemos é que a poda das ávores é, na maioria dos casos, feita com total desconsideração para com a planta, levando em conta somente as conveniências das pessoas e, pasmem, dos veículos e construções. Árvores de jardim não devem ser podadas nunca salvo algumas exceções. No caso das plantas frutíferas a poda é feita para que haja maior entrada de luz dentro da copa das árvores e um conseqüente aumento na produtividade e qualidade dos frutos. Em outros casos as árvores possuem alguma anormalidade e para isto fazemos o que pode ser chamado de dendrocirurgia. A dendrocirurgia nada mais é do que uma poda feita seguindo os critérios de proteção à saúde da planta. Esta prática serve tanto para a retirada de galhos e ramos como para a correção de partes lascadas do tronco e dos galhos.

Coletar água da chuva:

Uma atitude muito civilizada é economizar água. Para isto podemos dispor de uma série de procedimentos. Um deles é coletar água da chuva. É possível guardar grandes quantidades de água para a manutenção do jardim simplesmente instalando calhas nos telhados ou dispondo de outros truques para coletar e armazenar a água da chuva em tonéis com tampa, para evitar os mosquitos.


Alexandre de Freitas

Um comentário:

Edemar Carneiro - Viamão / RS disse...

Meus parabéns ao Alexandre Rattes de Freitas, este iluminado seguidor da filosofia e ciência ecológica do Prof. José Lutzenberger, (que foi um dos mais notáveis pioneiros do despertamento de uma Nova Consciência Ecológica no RS e no Brasil). Felizmente o velho sábio planetário, Dr. José Lutzenberger nos deixou uma grande herança cultural, social e científica, hoje orientada e compartilhada através da Fundação Gaia. Gostaria de recomendar a cada leitor desse artigo técnico de Alexandre Ratttes de Freitas que procurassem arquivar esta aula de jardinagem ecológica em seus computadores e dessem maior divulgação deste conteúdo, em face da importância e necessidade social de um permanente aprofundamento dessa temática. Gratidão pela aula, nobre amigo e conte sempre com meu aplauso e apoio, somados à uma efetiva e atenciosa amizade. Edemar Carneiro - (Ex-Professor, Numerólogo, Ufologista e Palestrante Motivacional).